VITRIOL ou o “abra-te Sésamo” para o mundo dos Deuses

César Rangel
7 min readApr 23, 2020

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o símbolo universal da constante busca do homem para melhorar a si mesmo.

VITRIOL ou V.I.T.R.I.O.L. é a sigla da expressão, do latim Visita Interiora Terrae, Rectificando, Invenies Occultum Lapidem, que quer dizer: Visita o Centro da Terra, Retificando-te, encontrarás a Pedra Oculta (ou Filosofal). Filosoficamente ela quer dizer: Visita o Teu Interior, Purificando-te, Encontrarás o Teu Eu Oculto, ou, “a essência da tua alma humana”.

É o símbolo universal da constante busca do homem para melhorar a si mesmo e a sociedade em geral. O termo é atribuído à um monge beneditino chamado Basile Valentin que viveu em meados do século XV, na Alemanha. Para os místicos, este é o termo mais misterioso e secreto que se conhece, a verdadeira palavra-passe ou o “abre-te Sésamo” para o “Mundo Oculto dos Deuses” ou dos “Homens Semi-Deuses”.

No entanto, este acrônimo V.I.T.R.I.O.L utilizado pela alquimia hermética de séculos passado toma outra aplicação para a maçonaria desde sua antiguidade até aos tempos de hoje. O primeiro contacto real que o candidato tem com a Maçonaria é através da Câmara de Reflexões, cujo principal papel é o de conduzi-lo à meditação. A Maçonaria oferece aos que ali se encerram um conjunto de símbolos que os levam a mais profunda meditação, de modo a induzi-lo a sentir uma verdadeira catarse, sofrendo uma profunda transformação interior.

Entretanto, a utilização destes símbolos difere quanto ao Rito Maçônico praticado, isto é, enquanto que nos Ritos Anglo-Saxônicos a mesma “câmara de reflexão” se concretiza pela passagem do profano por um simples recinto fechado e pouco iluminado, nos Ritos Continentais, para além destes aspetos, este habitáculo encontra-se provido de determinados objetos, com caráter simbólico, destinados a favorecer a reflexão do candidato, preparando-o para o que irá ouvir, na sua recepção na Loja.

Entre estes símbolos e elementos figuram correntemente, dispostos sobre uma mesa, recipientes contendo Sal, Mercúrio e Enxofre , entre outros pertinentes à esta câmara. No entanto a interpretação destes três símbolos é quase consensualmente associada a princípios Herméticos, apresentando, pois, uma origem alquímica, à semelhança da inscrição “VITRIOL”, também frequentemente presente em uma das paredes da Câmara.

Não obstante, na alquimia o VITRIOL é denominado como o “sangue do leão verde”, entretanto, sendo em realidade o vitriolo um “sal” na alquimia operativa, extraído de um mineral após algumas operações especiais em algumas épocas especiais. Importante fixar-se que o vitriol é um “sal”, pois ele é um dos componentes da trindade alquímica, isto é, composta por (sal, mercúrio e enxofre) apresentado n’O Rosário dos Filósofos (Rosarium philosophorum sive pretiosissimum donum Dei) um tratado alquímico do século XVI. Foi publicado em 1550 como parte II de De Alchimia Opuscula complura veterum philosophorum.

Assim posto, n’o Rosário é dito que quem conhece o sal e sua solução conhece o segredo oculto dos antigos sábios, ou seja, comumente é natural que se faça uma comparação entre o ternário alquímico (sal, mercúrio, enxofre) com o ternário espiritual (corpo, alma e espírito).

É importante que se note que não se fala aqui de substâncias químicas que levam esses nomes, mas sim de princípios — símbolos e representações — que são denominados desta forma. Isto é, onde em sua significação na tríade simbólica o (enxofre vai representar o caráter “ativo” masculino ou o princípio “ígneo” )— o poder da vontade que é tomada em seu sentido mais amplo como a Vontade de viver, a vontade como teorizou Schopenhauer.

Além disso, outra característica atribuída ao enxofre, é sua extração ser produzida do interior da terra e de suas profundidades, isto é, relativo ao que se trata do interior de cada ser, do que há de mais profundo em cada um de nós (no interior da Terra), ele justamente vai pertencer àquela categoria de influências celestes, ou seja, o espírito ou a Vontade da vontade, que opera em todo o mundo e em todos os seres, orgânicos e inorgânicos.

Já o Mercúrio é um elemento “passivo” feminino, isto é, um princípio úmido na linguagem alquímica e representa, não o domínio corporalpropriamente, mas sim o domínio sutil ou anímico, aquilo que se refere à Alma.

Por fim o Sal, o terceiro elemento da tríade alquímica, ele representa nesta manifestação o polo corporal, o Corpo, em oposição assim aos outros dois elementos (Mercúrio a Alma e o Enxofre o Espírito). Ele corresponderá à individualidade como um todo, em oposição ao Enxofre como princípio interno (nosso espírito) e o Mercúrio como o ambiente sutil em que um determinado estado da existência se manifesta, no qual nossa representação da individualidade se apresenta.

Em resumo, pode ser dito que o ser está envolvido na vontade e que a própria individualidade da vontade está envolvida no corpo.

Da esquerda inferior à direita em sentido horário 1.Vita, 2.Interiora, 3.Terrae, 4.Rectificando, 5.Invenies, 6.Occultum, 7.Lapitem

Na Alquimia é dito que ninguém pode se sobressair na arte hermética sem conhecer os seus princípios em si mesmos, ou seja, quanto maior o conhecimento que alguém tenha de si mesmo e dos elementos, maior será o poder de atração adquirido e maiores as realizações na arte hermética.

Deste modo, neste caminho da arte hermética proposto pelos alquimistas, essa via interior também do autoconhecimento estaria enigmaticamente resumida na sigla acrônimo do V.I.T.R.I.O.L:

(Visita o Teu Interior [da Terra], Purificando-te [em especiais condições de ambiente], Encontrarás o Teu Eu Oculto [seu eu verdadeiro], ou, “a essência da tua alma humana”).

O sal (o corpo) como uma individualidade que teria de ser utilizada para o conhecimento do ser, o mercúrio como (ambiente/alma) de si mesmo, ou seja, do (espírito Animus) em enxofre.

N’O Rosário dos Filósofos (Rosarium philosophorum sive pretiosissimum donum Dei) (parte 5_ Da demonstração de perfeição) Merculinus diz em forma de poema o que resumiria as ordens das operações desta Pedra filosofal, com a ajuda da qual essa coisa que buscamos é gerada e trazida à essência real.

É uma pedra escondida e enterrada em uma fonte profunda
E moldado nos caminhos e coberto com sujeira ou esterco
Esta pedra tem todos os nomes
Então Morienus, aquele homem piedoso, diz:
Esta pedra é uma pedra e nenhuma pedra
É um pássaro e nenhum pássaro
É Júpiter, Marte, Sol, Vênus,
E Luna
Agora prata, agora ouro e agora um elemento
Agora água, agora vinho, agora sangue
Agora leite de virgem, agora jorro de mar ou vinagre
Agora Sal Gemme, agora sal comum
Agora auripigmentum
Agora o mar purgado purificado com enxofre
E assim eles descobrem porque não o revelariam aos Ignorantes
Nem o esconda daqueles que são sábios
E que o cobre manuseado não seja distribuído aos tolos
Este apenas Luna é chamado por todos os nomes”.

Hermes Trimesgisto que deu origem à Alquimia escreveu um texto de aforismos/mandamentos A Tábua de Esmeralda no qual foi estudado pela tradição hermética durante séculos, trás resumida todos os grandes ensinamentos e ideias desenvolvidas pela alquimia, e que, podem revelar uma melhor e importantíssima compreensão do maior segredo dos alquimistas, o vitriol:

Tábua de esmeralda

(1) É verdade, certo e muito verdadeiro;

(2) O que está embaixo é como o que está em cima e o que está em cima é como o que está embaixo, para realizar os milagres de uma única coisa.

(3) E assim como todas as coisas vieram do Um, assim todas as coisas são únicas, por adaptação.

(4) O Sol é o pai, a Lua é a mãe, o vento o embalou em seu ventre, a Terra é sua nutridora.

(5) O Pai de toda Telesma do mundo está nisto.

(6) Seu poder é pleno, se é convertido em Terra.

(7) Separarás a Terra do Fogo, o sutil do denso, suavemente e com grande perícia.

(8) Sobe da terra para o Céu e desce novamente à Terra e recolhe a força das coisas superiores e inferiores.

(9) Desse modo obterás a glória do mundo.

(10) E se afastarão de ti todas as trevas.

(11) Nisso consiste o poder poderoso de todo poder:Vencerás todas as coisas sutis e penetrarás em tudo o que é sólido.

(12) Assim o mundo foi criado.

(13) Esta é a fonte das admiráveis adaptações aqui indicadas.

(14) Por esta razão fui chamado de Hermes Trismegisto, pois possuo as três partes da filosofia universal.

(15) O que eu disse da Obra Solar é completo.

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Obg. Att. César Rangel

Referência bibliográfica:

BONARDEL, Françoise. Filosofar pelo fogo/ Antologia de textos alquímicos. Ed. Madras, 2002.

O Rosário dos Filósofos. (Rosarium philosophorum sive pretiosissimum donum Dei) (Livros 1 a 5).

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César Rangel
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Written by César Rangel

Graduado em Letras (Unesp) e graduando em Filosofia (UFSCar), pesquisador e poeta. Além de ser um caminhante e perscrutador do V.I.T.R.I.O.L